Ação Social

NOTA FISCAL CONTRA O RACISMO

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Ser obrigado a mostrar nota fiscal em lojas para provar que não houve roubo é um dos mais típicos casos de racismo no Brasil.

Embora maioria no país, a população preta sofre constante perseguição por equipes de segurança e casos de falsa acusação de furto. Clientes constrangidos são coagidos a mostrarem a nota fiscal para comprovarem que são donos de algum objeto que possuem.

O racismo integra a estrutura social de modo que sequer necessita de intenção para se manifestar, ou seja, está nos contextos sociais e afeta os grupos racialmente identificados.

Esses grupos são discriminados de forma sistemática, direta ou indiretamente, como aponta o professor universitário e atual ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania do Brasil, Silvio Luiz de Almeida, no livro Racismo Estrutural.

A Grey Brasil criou para o programa Racismo Zero, desenvolvido pela Universidade Zumbi dos Palmares, a campanha “Notas do Respeito”, com o objetivo de chamar a atenção e conscientizar as pessoas sobre os diversos tipos de agressões racistas praticadas no varejo.

O programa oferece letramento racial para os colaboradores dessas empresas, concedendo um selo de “empresa antirracista” àquelas que zerarem os casos em seus estabelecimentos.

Na primeira fase da campanha, pontos de mobiliário urbano espalhados por São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília exibirão notas fiscais coletadas entre pessoas que já sofreram esse tipo de violência, explicando como pessoas negras são obrigadas a carregar seus comprovantes de compra e convidando as empresas a fazerem parte do projeto.

De acordo com Jose Vicente, reitor da Universidade Zumbi dos Palmares, a nota fiscal é um componente com uma comunicação sensorial indispensável.

“Ela comunica, coloca um símbolo potente para fazermos um georreferenciamento e traz evidências de como isso, além de ser uma realidade, produz danos e malefícios que podem ser evitados, enfrentados e, ao final, eliminados. E essa é a grande importância das notas fiscais dentro do “Notas do Respeito”, diz.

A segunda parte é um convite para que estabelecimentos comerciais façam parte do programa, por meio de uma ferramenta que transforma a nota fiscal, símbolo deste tipo de racismo, em um canal de protesto e denúncia.

Trata-se de um software que pode ser baixado de maneira gratuita, em “Notas de Respeito”, para ser utilizado em impressoras de notas fiscais. O software funciona como qualquer outro de notas fiscais, mas traz um QR code em forma de punho cerrado, símbolo da resistência negra, que direciona consumidores a um portal de pronto atendimento, onde é possível fazer denúncias e encontrar assessoria jurídica e emocional.

Além disso, as notas impressas pelo software trarão histórias reais de cidadãos negros que enfrentaram situações de racismo no seu dia a dia, tendo que provar que não furtaram ou roubaram algo que era deles. Falar sobre o óbvio para escancarar a realidade e apontar para o que precisa mudar.

O software será divulgado por peças em redes sociais, OOH e um filme, produzido em parceria com a Landia e a Malala Filmes, dirigido por Viviane Santos. Para usar o software, as lojas só terão que baixá-lo no site.

Para Gabriella Batista, criativa da Grey Brasil, a iniciativa pretende dar visibilidade a situações que não recebem o olhar da sociedade.

“O Notas do Respeito parte de uma dor cotidiana, dor essa que as pessoas negras são ensinadas a normalizar desde a infância, ou seja, ter sempre em mãos a nota fiscal para provar que pagamos por objetos e produtos que compramos. E a ideia de ressignificar um item tão emblemático quanto a nota fiscal, transformando-a em um canal de denúncia, parte da necessidade de questionar e coibir as violências racistas que ainda são muito normalizadas e aceitas pelo varejo e pela sociedade”, explica Gabriella.

Criação de Lucas Cabrini, Caio Camargo e Lucas Saicali, com direção criativa de Tomás Correa e direção geral de João Caetano Brasil.

Produção da Malala Filmes e Landia, com dieção de Viviane Santos e direção de arte de Tatiana Kordon. Áudio da Pingado, com produção de Silvanny Sivuca e Vitor Zafer e direção musical de Will Bone.