Entrevista

DIZER O MÁXIMO COM O MÍNIMO

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Marcello Serpa conta sua trajetória de sucesso com os livros “Vendo”, biografia, e “Vendo: Imagens”

Há dez anos fora do mercado publicitário, sete deles vivendo no Havaí, Marcello Serpa, o mais premiado designer brasileiro e um dos mais importantes nomes da propaganda mundial, lança dois livros com sua biografia e imagens com peças criadas.

“Vendo” escrito por Julius Wiedman, com entrevistas feitas por Paulo Lima e André Viana e publicados pela Editora Afluente, resumem a forma como ele enxerga sua arte, composta por ilustrações, desenhos, pinturas, gravuras e principalmente seus projetos em direção de arte.

“Vendo: Imagens”, apresenta obras criadas desde quando era estudante de design na Alemanha até campanhas premiadas.

Nesta entrevista, Serpa detalha sua carreira de 45 anos que mudou a história da propaganda brasileira com o primeiro Grand Prix do país em Cannes, seu aprendizado na Alemanha, os prêmios e a influência de publicitários brasileiros e do mercado exterior.

Entre tantas frases famosas do pensador cubano José Martí, uma se refere ao que o homem deve fazer em sua vida. Depois de filhos e livros, você também já plantou uma árvore?

Aos 62 anos de idade, desconfio que já cumpri a lista. São quatro filhos e três netos. Já plantei dois ipês, um branco e um amarelo. Agora estou lançando dois livros. Acho que passei no teste de José Martí.

Das centenas ou milhares de imagens publicitárias que você criou, em que patamar você coloca o anúncio do Guaraná Diet, Grand Prix em Cannes?

O anúncio do Guaraná Diet foi um divisor de águas na minha vida profissional. Ele veio num momento de transição, quando eu estava deixando de ser diretor de arte na DM9 para me tornar sócio e diretor de criação na Almap.

Além disso, por ser um trabalho de pura direção de arte, de repente se descobriu que era possível contar histórias, explicar benefícios, seduzir, convencer e vender apenas com imagens.

Ele é um exemplo do que sempre procurei no meu trabalho: o exercício da depuração, dizer muito com quase nada, como num haikai (poema curto de origem japonesa) visual.

Sobre sua carreira, qual a importância do estudo na Alemanha no direcionamento profissional que o levou a ser considerado o maior designer gráfico da publicidade brasileira?

Opa. Obrigado pelo elogio. Acredito que meu trabalho é o resultado de tudo que aprendi na Alemanha combinado com o meu DNA brasileiro. Lá aprendi disciplina e coerência, fundamentais no design. De volta ao Brasil, tudo isso se chocou com o nosso colorido, alegria e irreverência.

Sou o produto, um mutante, da mistura de duas escolas completamente opostas. O design alemão me ensinou a buscar o essencial e a ser coerente. O Brasil me ensinou a improvisar. No fundo, segui o tal antropofagismo dos modernistas: canibalizar o que vem de fora e regurgitar algo novo e brasileiro.

E quanto às influências desde o início de sua trajetória? Que criativos de direção de arte foram os maiores inspiradores?

Minhas principais influências foram Milton Glaser; o estúdio Mendel & Obra, de Munique,o Pentagram Studio, e Otl Aicher, um dos maiores designers da história da Alemanha. Depois aprendi tipografia e diagramação com Neville Brody, as aberturas de cinema com Saul Bass, e, na propaganda, meu primeiro grande mestre e primeiro ídolo foi Michael Schirner, diretor de criação da GGK de Düsseldorf, que revolucionou a propaganda alemã com uma escola brilhante, simples, direta, objetiva e ao mesmo tempo extremamente sofisticada.

Depois vieram os ingleses Paul Arden e John Hegarty, dois grandes diretores de arte, responsáveis pelos Anos de Ouro da propaganda inglesa. E, claro, Bill Bernbach, que com suas campanhas da Volkswagen representa, para mim, o marco zero da criação publicitária. Aqui no Brasil, Alex Periscinoto, Petit e Zaragoza foram os diretores de arte que criaram a base de onde eu e todos os brilhantes diretores de arte brasileiros nos lançamos.

Sei que é difícil escolher, mas que marcas tiveram maior importância, na sua opinião, na sua consagração profissional? Havaianas ou Volkswagen?

Acredito que todas as marcas com as quais trabalhei na Almap foram importantes. A construção da Almap como um todo representa minha realização como criativo e publicitário.

Havaianas foi um trabalho absolutamente pessoal, com o qual me identifico completamente. Quanto à Volkswagen, desde a primeira campanha para o relançamento do Fusca, encarei como um privilégio poder criar tantas campanhas icônicas para uma marca com um DNA criativo tão forte.

Em sete anos no Havaí você se voltou mais às artes plásticas. Foi uma volta às origens, um relaxamento social e profissional ou uma explosão de criatividade, às vezes limitada pelos briefings de clientes?

Na essência, nada mudou. Se antes eu trabalhava para dar forma às mensagens das marcas, agora pinto para compreender as minhas próprias. O processo continua o mesmo: observar, sentir, traduzir. O design me ensinou a buscar a síntese: dizer o máximo com o mínimo. A publicidade me ensinou a brasilidade, a empatia e a emoção. Na pintura, uso tudo isso que aprendi para continuar criando, mas, desta vez, sem briefing.

Para finalizar, quantos trabalhos, por alguma razão não veiculados, poderiam também ter ganho um Grand Prix em Cannes?

Na era das ações, ativações, social, brand experience, influencers e seus videocases espetaculares, veiculação é apenas um detalhe.